sexta-feira, 24 de maio de 2013

‘Ele só me dava pinga’, diz vítima de trabalho escravo em Passos, MG...

‘Ele só me dava pinga’, diz vítima de trabalho escravo em Passos, MG...

Homem era mantido escravo e apanhava de patrão em fazenda. 
Fazendeiro não foi localizado, mas deve responder pelo crime.
“Ele só me dava uma dose de pinga por dia”, disse o trabalhador rural José Geraldo Moreira de Araújo, de 49 anos ao se referir ao tratamento que recebia do patrão em uma fazenda de Passos (MG). Ele foi encaminhado para tratamento médico após ser encontrado em condições de escravidão na Comunidade das Águas, pela Patrulha Rural da Polícia Militar de Passos, nesta terça-feira (21).
Há oito anos, José Geraldo era tido como escravo de um fazendeiro da região. Segundo os vizinhos denunciaram à PM, ele mantinha o homem em um cômodo anexo à casa da propriedade rural e o alimentava apenas algumas vezes por semana com arroz e torresmo.
'Ele vivia em condições subumanas', disse o
sargento Abreu (Foto: Hélder Almeida/ Clic Folha)
No local não há água encanada e nem eletricidade. O trabalhador também não recebia salário e não teve folgas ou férias durante o período.
“Estivemos no local para averiguar as denúncias e constatamos que ele vivia em condições subumanas, sem ambiente para uma pessoa viver dignamente. No cômodo não havia conforto algum, apenas um amontoado de coisas e um mau cheiro terrível. É perigoso até que existam animais peçonhentos. Ele também não tem roupas e nem calçados, vive com doações de vizinhos que tem dó. Ele estava lá há oito anos sem folga e sem receber salário. Segundo os moradores vizinhos, o fazendeiro entregava R$ 100 por mês em dinheiro para algum familiar dele, o que não ficou claro e nem confirmado por ele”, disse o sargento Abreu.
Acompanhado pelo cabo Geraldo, eles estiveram na fazenda e constataram que além das condições precárias em que o trabalhador era mantido, havia também maus tratos. “Ele relatou que apanhava do fazendeiro com frequência e que só saia uma vez por mês, para em Alpinópolis (MG) onde vivem os parentes. Mas ele era mantido como escravo ”, acrescentou o militar.
Ainda de acordo com o policial, o dono da fazenda não estava no local. Apenas o filho dele foi localizado. Segundo o trabalhador que era mantido como escravo, o homem ia todos os dias à fazenda para lhe entregar a dose de cachaça e supervisionar o trabalho. “Ele sempre me batia quando achava que algo não estava como ele queria”, completou José Geraldo.
                    Trabalhador utiliza sapatos trocados por falta de
Segundo a PM, o Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) foi acionado já que o fazendeiro mantém oito cabeças de vacas leiteiras, mas sem local adequado para pastagem, o que obrigava o trabalhador a levá-las para a beirada da estrada ou a invadir propriedades vizinhas para se alimentarem. “Isso configura outro crime, que são os maus-tratos contra animais e também invasão de propriedades alheias”, pontuou o sargento.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Passos, Antônio de Paula Lopes, também foi acionado e acompanhou os policiais até a Delegacia de Passos. Segundo ele, o caso já está sendo analisado. “Nunca tivemos casos semelhantes, mas pelo que checamos, é realmente grave a denúncia. Este empregador, pela lei, tinha que manter o trabalhador com carteira assinada, recolhimento de FGTS, descanso semanal remunerado, férias, décimo terceiro, fornecimento de equipamentos de proteção individual e outros benefícios que o trabalhador precisa”, disse.
O boletim de ocorrência foi recebido na Delegacia de Passos e os envolvidos foram ouvidos. O suspeito ainda é procurado. A Polícia Civil disse que vai abrir um inquérito para apurar o caso. O fazendeiro deve responder por trabalho escravo, maus tratos de animais e porte ilegal de arma – já que uma arma antiga foi encontrada na casa dele.Ainda segundo Lopes, o caso será repassado ao Ministério Público do Trabalho e também à Comissão dos Direitos Humanos. “Vamos tomar todas as providências e garantir que o trabalhador receba pelo que já trabalhou”, pontuou.
Já para José Geraldo, toda a ocorrência tem apenas um sentido: “Quero ser um trabalhador livre, né”, finalizou.

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